A cama estava vazia. Eu estava sozinha. Olhei em volta do quarto para procurar algum vestígio da presença do Miguel ali, para saber se aquela noite não tinha sido imaginação minha...
A camisa. As calças. A camisa estava pendurada delicadamente nas costas da cadeira, que se encontrava ao lado da cómoda de madeira maciça, cor de mel; as calças de ganga estavam dobradas milimetricamente em cima do assento.
Mantive-me serena, o meu corpo nu, saboreando ainda as lembranças daquela noite cheia de prazeres satisfeitos.
Porém, a interrupção daquele momento foi feita por uma troca de palavras en tom azedo entre a Beatriz e o Miguel.
Estranhei o facto e quando me preparava para me levantar, para me pôr a par da situação, o Miguel entrou com um tabuleiro na mão e fechou a porta atrás das suas costas.
- A Beatriz já se levantou?
- Não - respondeu em desagrado perante a minha preocupação com ela - Acabou de chegar.
- O quê? - olhei para o relógio - Mas é quase meio-dia - exclamei.
- É porque dormiu em casa de alguém. Tal como eu... - Não disfarçou inicialmente a descontracção em relação ao assunto, mas depois o seu rosto suavizou.
- Estou preocupada com ela, Miguel - insisti. - Ela não anda bem. O que ela te disse? Nem parece dela... Quer dizer, ela devia estar habiutada, ela é que normalmente trazia estranhos aqui para casa...
- Pois... Ela disse-me que vocês têm regras em relação ao facto de um homem andar só de shorts pela casa... - disse, apontando o dedo para o seu corpo e exibindo um sorriso malicioso.
- Ela tem razão! Sempre lhe pedi para que não deixasse isso acontecer.
- Então, a culpa foi minha - deu-me um pedaço do bolo que eu tinha deixado em cima da mesa da cozinha, feito por mim na quinta-feira, numa tentativa de relaxamento. - Come e não te preocupes tanto.
- Vou tentar. Mas tenho que falar com ela na mesma. - Fiz uma pausa, mastigando o doce. Hesitei quanto à pergunta que tinha vontade de fazer, não querendo dar a sensação de que queria mais do que ele queria oferecer. Mas acabei por fazer - Tens planos para agora de tarde? Pensei que podíamos...
- Não posso - respondeu prontamente. - Prometi à minha mãe que me encontrava com ela e que jantava depois com ela. Cá para mim, ela quer-me apresentar o novo namordado, que conheceu nas suas aulas de danças de salão - rebolou os olhos e sorriu.
Torci o nariz perante a sua explicação.
- Mas podemo-nos encontrar amanhã - disse, tentando-se desculpar pela falha.
- Não dá - respondi. - Os meus pais vêm de Bragança para estar comigo.
- Está complicado então. Teremos de combinar qualquer coisa para segunda-feira só.
- Parece que sim.
Deu-me mais um pedaço de bolo à boca, enquanto ele comia uma bolacha de canela.
No tabuleiro estavam ainda duas canecas com café e leite, acompanhadas por um recipiente que continha açúcar.
Estava sentado à minha frente, com as pernas desnudas cruzadas. Eu tinha vestido uma camisola de alças de agodão branco. Nada mais.
Terminámos aquela pequena refeição, ele tirou-me o tabuleiro de cima das pernas e aproximou-se de mim. Beijou-me a testa, depois os olhos, em seguida o rosto e por fim a boca. Não nos cansávamos de nos tocar mutuamente. Parecia sempre uma novidade, apesar de não haver grandes segredos. De cada vez que estávamos juntos, surpreendíamo-nos, a intimidade não parava de aumentar, como se isso fosse possível.
Depois de mais uma vez nos termos entregado aos prazeres da carne, de um modo mais silencioso, pela presença da Beatriz no quarto ao lado, ele manteve o seu peso em cima do meu corpo, olhando-me, parecendo que ainda não estava satisfeito.
- Amo-te - declarou ele.
Não soube como reagir. Mas quis fugir ao olhar espectante dele e beijei-o com intensidade.