Subitamente o murmúrio das conversas paralelas parou. O eco do meu gesto espalhou-se pelo espaço e inevitavelmente a curiosidade sobre o que se passava ali lançou-se sobre nós.
Sentia o meu corpo ser invadido por uma onda de choques electrizantes, que alimentavam naquele preciso momento a minha raiva.
Alguém me chamou à atenção, tocando-me no braço direito.
- Acho que este não é o melhor sítio para vocês discutirem - falou o Nuno.
- Sim, tens razão. - conclui.
Mas isso não interrompeu a minha ansiedade de o atacar.
Vesti o meu casaco preto e precipitei-me para a saída, sabendo que ele me acompanhava num passo mais lento.
- Mas tu pensas que sou idiota? Tenho escrita a palavra 'idiota' na testa para poderes mentir-me assim? - gritei.
- Mas não te menti - bradou ele.
- E esperas que acredite na tua palavra, depois de me teres dito que ias estar com a tua querida mamã, mas afinal encontro-te aqui com os teus amigos?
- Espero, sim - admitiu, aproximando-se de mim, tocando-me nos meus ombros.
- Larga-me. Não admito sequer que me toques.
- Foda-se. Mas estás a brincar comigo? - questionou, perdendo as estribeiras - Não significou nada para ti o que aconteceu esta manhã?
- NADA! - uma pequena mentira, disse para mim. - E não mudes de assunto, porque o que está em causa não foi o facto de termos passado a noite juntos, mas sim o facto de me mentires.
- Porra, já te disse que não te menti. Eu estive com a minha mãe, Ana.
- Pára de mentir, Miguel, estou farta de mentiras. Tu, o Márcio... Vocês são todos iguais! Uns mentirosos!
Irrompi pelo estabelecimento adentro, deixando-o só na rua, ao frio, sob a fraca luz da lua, que iluminara as minhas palavras amargas.
Peguei na minha carteira de pele vermelha, que se encontrava pendurada sobre as costas da cadeira e fiz o percurso inverso, ignorando a presença dele já no interior do café e dirigi-me até ao meu carro, que estava a escassos metros dali, numa rua transversal.