Depois do repasto, fomos até à praia, que ficava a escassos metros de onde nos encontrávamos.
As estrelas apareciam timidamente por entre algumas nuvens que deambulavam na noite, com um ligeiro vento a soprar como companhia.
Passeámos pelo passadiço de ripas de madeira, sentindo a aragem gélida entre a pele e os ossos.
- Gostei da tua ideia, mas está frio - comentei.
- Queres ir embora?
- Não, não é isso. Só me estou a queixar... Esquece!
- Acho que tenho um casaco a mais no carro. Vou buscá-lo.
Estávamos ainda perto do estacionamento, por isso não demorou muito para que começasse a sentir o meu corpo mais quente.
- Estás melhor?
- Sim, obrigado. Estavas a dizer-me que te dás bem com o teu irmão. Eu acho que deve ser complicado trabalhar com familiares. No pouco tempo que ajudei a minha mãe, desentendi-me por várias vezes com a minha irmã...
- Nós os dois somos diferentes, mas isso não pode nem deve interferir no trabalho. Não quer dizer que de vez em quando isso não aconteça, não é...? Ia-te perguntar o que tu fazes, já que a tua tia não conseguiu explicar-me, mas não quero falar mais de trabalho. Costumas ir a Bragança?
- Não. - Era a verdade. Detestava fazer a viagem e egoísta, preferia que fossem os meus pais a visitarem-me - Vou apenas em algumas épocas festivas, nas férias vou para um sítio bem distante de lá...
- Porquê? Já percebi que tens uma relação... como hei-de dizer... complicada com a tua irmã, mas e com os teus pais?
- Dou-me bem com eles, mas prefiro trocar com eles um telefonema do que uma visita pessoal. Não é por nada, acho que simplesmente me habituei a viver sozinha, a fazer o que quero, sem ter aquelas preocupações sufocantes em cima de mim... - respondi.
- Imagino que seja também por isso que não vais lá mais vezes... - disse, olhando para mim.
Desviei o olhar dele e falei:
- Preferia mudar de assunto, se não te importas. - Ora aí estava algo que optava por não dissecar: anos de discussões, ciúmes e acusações entre mim e a Tânia, a maninha mais nova.
- Acho que é difícil entre raparigas. As minhas irmãs, mais uma vez, meias-irmãs...
- Surpreendes-me de cada vez que falas na tua família!
- Pois... Elas também não se davam. Agora está melhor, mas volta e meia discutem...
- Tens de me dizer que família não tem os seus problemas...