Depois de saborearmos o café, sentados lado a lado timidamente no sofá, ajudou-me a arrumar as coisas para a cozinha. Fazia lembrar aqueles casais... Não, esquece, não fazia lembrar nada!
- Sabes quando foi a primeira vez que te vi? Foi em Setembro de 2007. - afirmou, encostado à parede.
- Mas ainda nem sequer trabalhava...
- Pois... Fiquei a pensar como se podia gostar de uma pessoa que nem sequer se conhece, especialmente porque não acredito em amor á primeira vista - confessou. - Mas passado um mês, ou algo do género, começaste a ir com frequência ao café da D. Celeste, tua tia, como descobri mais tarde.
- A sério?! - sentia-me encabulada por tal atenção e mantive-me virada para a banca, fingindo que lavava a louça.
- Quando finalmente tomei coragem de falar contigo, tive uns problemas familiares e comecei a hesitar até que desisti de me ir apresentar. Passado uns tempos, voltei a ter vontade de te conhecer, mas deixaste de aparecer no café. Pensei que estivesses assoberbada de trabalho, mas os boatos começaram a correr, até que confirmei com a tua tia que tinhas partido o pé.
- É verdade - acabei por me virar para ele - Foram semanas insuportáveis. A minha mãe queria que eu fosse para Bragança, imagina...
- Depois, pela segunda vez, duvidei se seria capaz de tomar a iniciativa e quando voltaste simplesmente consolei-me por te ver... Pensei que não quisesses nada comigo. Nunca me apercebi se retribuías o olhar...
O telemóvel dele tocou.
- Devias ter desligado isso, Miguel - falei, desagrada pela interrupção.
- Eu sei, desculpa. Venho já.
Voltei costas e concentração para a lavagem da louça, mas estava curiosa quanto à origem e assunto do telefonema. Mas passado poucos minutos, ele apareceu.
- Vou ter que ir embora, Ana.
- O quê?!
- Prometo - começou, enquanto se aproximava de mim - que será a última vez que seremos interrompidos por causa deste assunto. Isto não deveria ter acontecido - desabafou.
- Mas afinal o que se passa? - questionei, não pela curiosidade, mas pela preocupação no olhar dele.
- Eu depois conto-te melhor, mas o que se passa é que a minha mãe, a minha madrasta e os meus irmãos não se entendem quanto à herança que o meu pai deixou. Resumindo é isso. Hoje disse-lhes que não queria ser interrompido, mas estão tão cegos que já perderam o respeito por mim e por eles próprios.
- Vai com calma, Miguel - disse, estupefacta com a revelação. O pai dele devia ter falecido há pouco tempo...
- Não te preocupes - Deu-me um beijo na testa e foi embora.