À noite fui até casa do Ângelo e da Raquel, um casal amigo, que morava no prédio contíguo ao nosso e fui surpreendida mal entrei na casa deles.
De copo de uísque na mão, pensativo, o olhar perscrutando a pouca actividade na rua, ali estava ele.
Depois da demonstração de carinho e posse, não esperava vê-lo e, contudo, uma esperança ténue permanecia até ao momento em que primi o botão da campaínha.
Dirigi-me a ele após os cumprimentos habituais, já com um pequeno copo contendo vinho do Porto.
Sorri quando me coloquei frente a ele e o Tiago devolveu-me um olhar frio e um esgar de lábios irónico.
- Então já resolveste tudo com o teu amigo?
Fez-me a pergunta enquanto eu degustava a minha bebida, após uns minutos de silêncio.
- Desculpa?! - pronunciei,enquanto limpava alguns salpicos de vinho à volta da boca. Tentei controlar a respiração para a tosse não transparecer para os presentes o incómodo da pergunta. - Não havia nada para resolver, Tiago, tinhamos apenas que esclarecer alguns pontos do passado.
- Então já lhe contaste que és uma ladra?
- Porra, Tiago, quando queres consegues ser mesmo um estupor! Não te entendo. Se sou assim tão má pessoa, porque é que te casaste comigo? Porque é que continuas atrás de mim mesmo com o processo do divórcio a decorrer, se fazes questão de me atirar à cara essas coisas?
- A culpa é tua, Diana. Tu é que fazes questão de te refugiar no teu passado quando precisas de tomar uma decisão. Usas o teu passado como desculpa para muita coisa que acontece na tua vida. - Bebeu um gole de uísque e continuou - Eu já te disse que não me me interessa o teu passado! A única coisa que me interessa é como tu foste/és a partir do momento que te conheci. E mais te digo: és uma pessoa muito especial, com muito valor. És inteligente, tens um sentido de humor que adoro, és simpática, dás tudo pelos teus amigos. O que queres mais? Achas que é preciso mais alguma coisa?
- Tiago...
- Diana - chamou a Raquel - podes chegar aqui?
Ela encaminhou-me até a cozinha, onde me pediu desculpa pela presença do Tiago.
- Quando combinei com o Ângelo esta pequena reunião, não lhe disse para não convidar o Tiago, mas acho que estava implícito... Em todo o caso, mais uma vez desculpa, deve ser constrangedor para vocês. Ainda agora parecia que estavam a discutir... - adiantou, encostada ao balcão.
- Não te preocupes, Raquel. Ainda hoje almoçamos juntos lá em casa. Ele tem-me apoiado com esta história da morte do meu pai - retorqui, encostada, por meu turno, à pequena mesa quadrada branca colada à parede.
- Falas de uma maneira tão fria sobre isso, Diana, decerto que te afectou de algum modo...
- Raquel, não é segredo que eu e o meu pai não nos dávamos e já não falávamos há muito tempo. Estou cá há quase dois anos e se falámos mais de duas vezes foi muito.
- Mas...
- Raquel, desculpa, mas não me apetece falar sobre o assunto. Podemos voltar para a sala? Estão todos animados e eu hoje também quero ficar animada...