Ouvi o som abafado da campainha tocar. Resisti em sair do conforto e do calor da casa-de-banho para atender um estranho. Não queria.
Embrulhei-me numa grande toalha bege e silenciosamente, pé ante pé, fui até à porta da entrada. Coloquei-me em bicos de pé e espreitei pelo pequeno orifício.
Não podia ser. Não podia ser ele. Aqueles cabelos castanhos escuros que eu acariciara tantas vezes, aqueles olhos brilhantes e esperançosos, o pequeno nariz com uma ligeira curva devido a uma queda. Todos os pormenores daquele rosto. Eu conhecia-os e ainda assim teimava em não querer enfrentá-lo. Nem a ele, nem aos meus sentimentos...
Encostei-me à porta, inspirando e expirando, como que tentando ganhar forças para mais uma discussão.
Finalmente abri a porta.
Ali, defronte a ele, deparei-me com um homem abatido, triste e desolado.
Deixei-o entrar mesmo antes de ele pronunciar o breve cumprimento de boa tarde.
Ele não conhecia aquela casa. Aquela casa era só minha. Ali, no Porto, tinha um espaço só meu, sem que ninguém entrasse sem avisar...
Fui imediatamente ao meu quarto vestir-me. Uma calça de fato de treino azul escura sem elástico no cós e uma camisola de algodão branca. Regressei com a mesma rapidez à sala, onde o tinha deixado.
Os nossos olhos cruzaram-se e ficaram estáticos, como que hipnotizados. Vi-o aproximar-se de mim, sem que pudesse evitá-lo. Acariciou-me a barriga com carinho, tentando sentir o nosso filho. Deixei-o chegar-se mais a mim. Eu queria, eu precisava de sentir o toque dele, tinha tantas saudades do toque dele. Sussurrou-me ao ouvido que me amava como desde o primeiro dia em que me vira e que tinha chegado a vez dele de correr riscos. Ia-se mudar para o Porto.