Os TEXTOS que se seguem são pura FICÇÃO e qualquer semelhança com a REALIDADE é pura coincidência!
Este espaço permite-me dar-vos a conhecer todo o meu entusiasmo pelas palavras.


df @ 13:40

Seg, 30/11/09

- Ouviste o que eu disse.

- Sim, ouvi, mas parece que não entendi muito bem. - Aproximei-me dele e girei a sua cadeira, fazendo com que o seu corpo ficasse virado para mim. Tu também vais estar presente? A que propósito?

- Não sei, o advogado não me adiantou nada. Só disse que eu tinha de estar lá. Pensei que te tinha dito.

- Mas não disseste. - respondi, sentando-me na cama. - Não estou chateada por isso, porque eu também não te disse que vinha, mas o meu pai tem que fazer sempre das suas mesmo depois de morto!

- Não digas isso - Puxou a cadeira para próximo de mim e pegou-me na mão. - Eu sei que o teu pai te fez, melhor que ninguém eu sei. Mas eu conheci outra faceta dele, uma faceta generosa e compreensiva.

- Ele só foi assim contigo para compensar o mal que me fez.

- Acho que não acreditas nisso. Sabes perfeitamente que ele nunca se arrependeu de te ter educado como educou... Mas não vamos tirar conclusões precipitadas antes de se saber o que está escrito no testamento. - passou a palma da mão esquerda no meu rosto, num acto intencional, demasiado íntimo. Mas retirou-a imediatamente e a sua expressão alterou-se. - Afinal o que querias falar comigo?

- Queria-te falar sobre ontem.

- Explicaste-te, acho que já não há mais nada para dizeres. Fizeste-me fazer figura de palhaço à frente dos meus amigos com a tua reacção. Só isso - Voltou a olhar para o computador.

- Não foi minha intenção, Ricardo. Acredita. Só que estou...

- Já sei, Diana. Estás cansada de falar sobre a tua vida com os teus pais. Mas isso não te dá o direito de fazer o que fizeste. Eu perguntei-te por várias vezes se não te importavas que fôssemos ter com eles. - Voltou o rosto para mim e olhou-se de uma forma, que me gelou. - Eu só queria que tu os conhecesses. Só queria incluir-te de uma forma mais completa na minha vida, mas parece que ainda não estás preparada para isso. Compreendo, mas não desculpo o que fizeste. - fez uma pequena pausa, inspirou e disse - Sabes, parece que afinal não te conheço, o que se calhar é natural, já se passaram alguns anos. As pessoas mudam.

- Mas eu não mudei, Ricardo.

Mas ele não me quis ouvir. Pediu-me que o deixasse sozinho e que se eu quisesse podia voltar para o café, que depois me chamava para irmos os dois juntos para casa dos meus pais.

 




df @ 13:19

Qua, 25/11/09

Cheguei a Perosinho às três da tarde. Uma hora de antecedência para a tal reunião com o advogado de família.

Estacionei o carro junto ao muro da casa dos meus pais e atravessei a rua de paralelo já gasto pelo tempo até ao pequeno café da mãe do Ricardo.

Ao subir os dois degraus da entrada, percebi que todas as conversas paravam. Nos seus pensamentos passava, com certeza, a peculiar pergunta: 'é a filha do Bernardino e da Lurdes. O que ela está aqui a fazer?'

Passei entre as mesas à procura de uma vaga para eu me acomodar, tentando ignorar os olhares e os comentários silenciosos dos meus antigos vizinhos. Sentia-me observada a cada movimento que fazia...

A senhora Noémia contornou o balcão com tampo de mármore e aproximou-se de mim. Pedi-lhe um café e perguntei-lhe pelo Ricardo. Respondeu-me que antes de o avisar que eu estava ali, queria falar comigo.

- Este não é o melhor local para conversarmos sobre isto, mas como não costumas vir para estes lados... - Tinha-se sentado de costas para a maior parte dos clientes, que se amontoavam nas mesas iniciais do estabelecimento. Falava num tom baixo, mostrando a discrição de que precisava para o assunto em questão. - Bem, como tu sabes, melhor que ninguém ao que parece, os teus pais sempre foram excelentes pessoas em manter os seus problemas dentro de quatro paredes. Nem mesmo com os amigos eles partilhavam as coisas. Não sei se por quererem ser discretos, por não quererem pessoas intrometidas ou simplesmente porque talvez soubessem que faziam algo de errado. Não sei... 

Beberiquei o restante café da pequena chávena escaldada, sem tirar os olhos daquela mulher de cabelos curtos e encaracolados, que ora pendiam para o castanho ora para o cinzento.

- Para a maior parte das pessoas, os teus pais tinham um casamento perfeito e só foi ligeiramente abalado pela filha mal agradecida. - continuou ela. Acomodou-se mais um pouco na cadeira de madeira, forrada a um tecido de má qualidade. - Ninguém aqui sabe o teu lado da história, apenas nós e não vamos espalhá-lo, não te preocupes, até porque não é da nossa conta para fazer seja o que for agora, pois já não podemos alterar nada. Nós nunca acreditamos numa única palavra do Ricardo e nem mesmo nas supostas provas que tu mostravas. Para nós, as nódoas negras eram simplesmente o resultado das vossas brincadeiras. Nunca passou disso. Mas depois foste embora e tudo começou a fazer sentido, até mesmo o facto do teu pai não te querer cá em casa com o Ricardo... - respirou fundo, preparando-se para finalmente abordar o assunto de que queria falar. - Bem, o certo é que o casamento dos teus pais realmente nunca foi perfeito. Eles eram diferentes, entendes? Depois de tu nasceres, ainda pensei que tudo melhorasse. As condições financeiras melhoravam a olhos vistos. O objectivo do teu pai foi cumprido: ele tinha a sua própria frota de táxis, entendes... E a tua mãe pôde ficar em casa, deixar de trabalhar, que era o que mais queria. Bem, tu deves ter uma ideia de como os teus pais eram. Hás uns meses atrás, sem querer, ouvi uma discussão entre eles. Sabes como é, às vezes deixámos abertas as portas das nossas casas... Foi uma discussão muito feia, com acusações mútuas, mas o certo é que ouvi o teu pai falar em divórcio.

- O queê?! - pronunciei por fim. - O meu pai? Aquela pessoa tão cumpridora dos bons costumes e das regras?

- Agradeço que não sejas irónica, Diana. Não te conhecia assim.

- Desculpe que lhe diga, mas a única pessoa que me conheceu verdadeiramente foi o Ricardo. - Irritei-me quanto àquela afirmação. Nunca tinha acreditado numa única palavra da minha parte, dizendo sempre que era uma invenção das nossas cabeças, minha e do Ricardo, e agora... - Quanto aos meus pais duvido muito dessa situação. A minha mãe só via o meu pai à frente. Eu fui só um meio para satisfazer o desejo do meu pai querer ter filhos, pelo menos foi a essa conclusão a que cheguei. Agora, pode ir dizer ao Ricardo que estou aqui e que quero falar com ele?

A Noémia levantou-se contrariada com a minha reacção e saiu do café, dando indicação ao marido, o Abílio, que ia a casa. Pouco tempo depois regressou sozinha, dizendo-me que o Ricardo tinha dito para eu subir.

- Deixei-te a porta aberta. Ele está no quarto. Suponho que ainda te lembres. - retorquiu.

Agradeci e tentei passar entre ela e a mesa.

- A única coisa que te peço, Diana, é que não voltes a magoar o meu filho como o fizeste há uns anos atrás. Ele ficou de rastos e demorou muito tempo até chegar onde está. Ele tem uma vida tranquila e estável. É professor e tem uns amigos que realmente se preocupam com ele. Não o voltes a magoar.

'Raios, mas quem ela pensa que é?'

 

A porta de madeira já era bastante antiga, mas ainda assim estava em bom estado. Entrei e subi as escadas que davam ao andar superior, que ficava mesmo por cima do café.

De repente vi duas crianças, um menino e uma menina, a correrem atrás uma da outra, rindo, gritando uma para a outra. Uma dizia 'não me apanhas' em tom de desafio e a outra respondia que a ia apanhar de certeza. Era eu e o Ricard.Um daqueles momentos inocentes que tivemos juntos naquela casa.

Bati à porta do quarto dele, que ainda tinha duas placas coladas, uma que informava a quem pertencia aquela divisão e outra dizia 'não incomodar'.

Depois de ele me dar autorização, entrei e deparei-me com um quarto sóbrio. Paredes brancas, um cama de solteiro, prateleiras recheadas de livros, uma cómoda e uma secretária com dois computadores. Ele estava compenetrado no portátil, digitando uma série de palavras num documento de texto.

- A minha mãe disse-me que querias falar comigo - falou, mantendo-se confortavelmente sentado na cadeira forrada a tecido preto. - Estou só a tentar terminar este relatório para apresentar na escola na segunda-feira. Isto de ser director de turma dá que fazer... Além disso, daqui a pouco temos que ir para casa dos teus pais para a leitura do testamento e...

- O quê?!

 




df @ 14:03

Sab, 21/11/09

(imagem retirada da internet)

 

Chove lá fora.

A névoa criada pela queda destas pingas necessárias para a vida quase impedem que eu veja para lá da cortina azul, para lá da janela, o mundo girar.

Estou resguardada no conforto da minha casa, enroscada no meu cobertor que guardo desde a infância, ignorando as imagens da televisão ligada, esperando que algo aconteça.

Observo as inúmeras janelas dos prédios à volta de onde estou, portas para outras vidas, e penso no que poderão estar as outras pessoas a fazer.

Mas rapidamente esqueço isso e prendo a minha atenção no pequeno gato que salta nos telhados. Malhado e molhado, passa de uma casa para outra, procurando um pequeno abrigo, para se poder enroscar como eu no calor do seu corpo. Desce de um muro para um quintal com aspecto abandonado e entra numa pequena barraca, que tem a porta envelhecida pelo tempo e um orifício suficiente para se poder esconder da chuva que cai e que ele não gosta. Perco-o de vista.

Mas atenta como estou para o que se passa lá fora, continuo a segurar a cortina para o lado e a olhar para os carros que chegam e partem, para as pessoas que se tentam proteger da chuva, mas que têm que lhe fazer companhia por um motivo ou por outro.

Como estou sozinha em casa e, apesar do do aconchego do meu lar, apetece-me sair lá para fora, correr sobre a chuva, cantar e gritar ao mundo que estamos juntos neste estado de tempo, que podemos partilhar a alegria da chuva e não a sua tristeza.

Mas fico-me pelos pensamentos...

 




df @ 15:52

Qui, 19/11/09

Após uma conversa mais animada ao jantar, fomos até ao tal bar que o Ricardo tinha falado.

O Ryan's era um bar irlandês, muito acolhedor. No piso térreo, deparamo-nos com um bar do lado direito comprido e mais ao fundo uma série de mesas redondas. A decoração remetia-nos tipicamente para a cultura irlandesa. Depois de subir umas escadas de madeira em caracol, fomos até ao segundo piso, onde os amigos do Ricardo nos aguardavam. Aqui estava um pequeno balcão do lado esquerdo numa sala com mesas baixas e uma segunda para fumadores. Sentámo-nos à volta da última mesa que fazia a separação de ambos os espaços. Assim, quem era fumador, como eu, podia levantar-se e com apenas um passo respeitar as regras impostas. 

Eu não conhecia aquele bar. Eu não conhecia praticamente bar nenhum no Porto e acho que em nenhum outro sítio nas redondezas. O meu pai tinha os meus horários de tal maneira controlados, que saí poucas vezes à noite e já quando frequentava a faculdade, exigindo que me fosse buscar e que não aceitasse boleia de ninguém.

O Ricardo apresentou-me a Helena e o Rodrigo, o Nelson e a Mónica e ainda o Nuno, que viera sozinho, por indisposição da esposa Bianca. Todos eles eram amigos de faculdade, professores em exercício e outros sem colocação.

Sentia-me completamente desenquadrada ali, fazendo-me lembrar as palavras do Tiago a esse respeito. Tentei sorrir para disfarçar esse desconforto.

Era verdade que tinha conhecido o Ricardo muito antes que eles, tinha sido eu que o acompanhou na adolescência, foi comigo que ele teve várias primeiras vezes... E, contudo ali sentia que eu é que era a intrusa. Eles eram os amigos dele. Eu tinha sido a amiga que fugira, que lhe tirara o tapete debaixo dos pés, depois de lhe ter prometido que era a última vez que terminávamos o nosso relacionamento naquela tarde de verão, no meio do pinhal, quando nos decidimos candidatar a uma faculdade diferente.

A dada altura, umas das amigas do Ricardo, a Mónica, aproximou-se mais de mim e começou a falar comigo como se nos conhecêssemos há imenso tempo, praticamente palavras dela.

- O Ricardo falou-nos tanto de ti quando nos conhecemos. Sabes, cheguei a ter um fraquinho por ele, mas ele só falava numa Diana. E agora entendo porquê. Além de simpática, és bonita! - E em jeito de confidência - Adoro o teu cabelo. O meu é liso, o teu é volumoso e encaracolado. Que inveja!

- Obrigado - agradeci, um pouco constrangida com a situação.

- Olha, mudando de assunto, e desculpa se estou a tocar em algo que te seja... Bem, cheguei a pensar que fosses uma pessoa imaginária na vida do Ricardo e que, se existisses, não podias ter passado por tudo aquilo que ele nos contou e teres coragem para saíres de casa dos teus pais e enfrentar um mundo novo. É mesmo verdade tudo aquilo que ele disse? Que o teu pai era mesmo...

- Depende - respondi imediatamente - A parte em que o meu pai me controlava todos os passos ou aquele em que batia ou me castigava de outra forma e a minha mãe lhe dava razão, mesmo sem eu ter feito nada?

- Desculpa, Diana, não te queria transtornar...

Respirei fundo, tentando... Sei lá o quê...

- Não, não tens culpa. Eu é que não sou neste momento a melhor companhia. Também estou a atravessar por um divórcio complicado...

- Lamento muito...

Levantei-me e comecei a despedir-me.

- Gostei muito de vos conhecer, mas vou-me embora.

Desci as escadas e paguei o mais rápido possível a coca-cola que bebi, que preferi à cerveja irlandesa que não me agradou, para nem sequer dar tempo ao Ricardo de protestar.

Saí para a rua e apertei o casaco. A noite estava fresca e húmida, não fôssemos estar tão perto do Rio Douro. Virei à direita em direcção à Praça do Infante e tirei finalmente o meu primeiro cigarro da noite.

- Espera, Diana.

Não queria olhar para trás.

- Espera - voltou a repetir, alcançando-me. Puxou-me pelo braço esquerdo, fazendo com que o meu corpo rodasse sob os calcanhares, virando-me para ele.

- Porque é que te vais embora? Foi alguma coisa que eles te disseram?

- Não, Ricardo, não tem nada a ver com eles. Gostei muito de estar convosco, mas...

- Mas o quê, Diana?

- Enquanto estava a falar com a... com a Mónica, lembrei-me do que o Tiago me disse na nossa última discussão - levei o cigarro à boca, ao que segundos depois expeli o fumo para o lado - Parece que a minha vida se resume aos maus-tratos que recebi do meu pai. Estou farta disso. Já contei a minha história vezes sem conta. Estou farta!

- Mas isso faz parte da tua vida, Diana - enfatizou - Não podes esconder isso ou simplesmente ignorar.

- Mas eu já fiz coisas para além de sofrer como sofri. A tua amiga falou na coragem que tive ao fugir para Lisboa, mas não quis saber o que fiz lá, só o que me levou a fazê-lo.

- É triste, mas as pessoas sentem curiosidade... Mas não leves a mal a Mónica. Ela foi a primeira pessoa com quem desabafei tudo o que nos tinha acontecido, foi com ela que... É natural que ela se tenha entusiasmado demais!

- Mas não entusiasmo possível. Ricardo, vou para casa, vou apanhar um táxi.

- Não, Diana, deixa-me ao menos levar-te a casa.

- Agradeço, mas não. De certeza que se subir aqui esta rua, encontro alguma praça de táxis ou algo do género.

- Não digas disparates. Daqui à Maia, a viagem ainda é cara e não há necessidade para isso. Deixa-me levar-te a casa.

Apaguei o cigarro com a sola da bota e acedi ao pedido dele.

A viagem de vinte minutos foi feita em pleno silêncio, estando apenas o rádio a tocar música sem interesse para nós. Saí do carro dele, desejando-lhe secamente uma boa noite e fui para minha casa.

 




df @ 16:08

Sex, 13/11/09

Depois de um dia mais intenso que o anterior na loja - com um maior número de vendas e a recepção de ovos produtos -, eu e a Adriana fomos para casa satisfeitas e com o sentido de dever cumprido.

Tomei um longo banho e preparei-me para a minha saída com o Ricardo.

Vesti uma túnica de malha preta com uma faixa azul petróleo no fundo e acompanhei com uns leggins e umas botas de cano alto também negros. Os meus cabelos castanhos escuros - herança genética vinda do meu pai - iam soltos, mas deitei um pouco de espuma para que as madeixas onduladas não estivessem tão selvagens.

O Ricardo apareceu pontual como já era característica dele desde que o conheci. Vestia umas calças de ganga, hábito diário, mas com uma camisa preta, com umas listas finas brancas na horizontal, sendo que a acompanhava um blazer de fazenda cinza escuro.

O local para o repasto recaiu sobre um restaurante na Avenida Fernão Magalhães, no Porto, que ele gostava muito e recomendava. Era um espaço pequeno, com perto de uma dúzia de mesas, decoradas com uma toalha azul forte, com paredes revistas a pedra, ou imitação, dando um aspecto rústico. O empregado, um homem alto e cabelo ralo, era simpático e afável.

- Ele já me conhece - comentou o Ricardo, depois de termos feito o pedido.

- Eu percebi. Também percebi que tens por hábito jantar fora...

- Não - respondeu. - Todas as sextas-feiras, tenho, por hábito, juntar-me com alguns colegas de faculdade, com os quais mantive contacto e dão aulas aqui perto, e vimos normalmente jantar aqui e...

- Pois, então estraguei-te os planos...

- Não, não estragaste. Hoje íamos a um outro sitio. Portanto, eles foram, mas eu não. Mas como te disse e repito se não te importares, depois vamos ter com eles, a um bar ali na Ribeira...

- Que também já é hábito irem. - adiantei. Ele acenou que sim. - Tornaste-te num homem de hábitos.

- Isso é bom ou mau? - perguntou.

Peguei no maço de tabaco que tinha na carteira, mas só depois me lembrei que tinha de me levantar e ir para a rua se quisesse fumar. Acabei por pousá-lo em cima da mesa. O Ricardo retribuiu-me a ironia com um sorriso.

- Então não respondes?

- Não sei o que te responder. Acho que criaste uma rotina confortável na tua vida, mas sem que esta se torne demasiado monótona. Serve?

Ele soltou uma gargalhada, divertido com o meu comentário. Bebeu um gole de vinho branco e disse:

- Sou o único que ainda vive com os pais. Entre os meus amigos, sabes? Todos eles já saíram debaixo das saias da mãe, eu não. Talvez por isso goste daquilo que já se tornou um pouco de rotina para mim. Os meus já se acostumaram com isso.

- Nunca quiseste ter o teu canto? Eu sei que nós falávamos em ter o nosso canto, mas...

- Só imaginei isso... Nunca me imaginei a viver sozinho.. Quando estive com a Bárbara, no curto espaço de tempo em que estivemos noivos, ainda chegamos a ver alguns apartamentos, mas nunca encarei verdadeiramente a possibilidade de sair de casa dos meus pais e acho que se o fizer, terá que ser perto deles. Eles ainda precisam de ajuda no café, especialmente agora que a idade começa a pesar... O meu irmão, o Renato, só pensa na faculdade e nas festanças e portanto não quer saber de ajudar... Mas também de uma certa forma, sinto uma espécie de obrigação, porque eles se esforçaram muito para me manter durante mais de um ano em Guimarães-

- É enternecedor! - exclamei. Foi a única palavra que me veio à mente. Não sabia o que era ter pais a fazerem sacrifícios de uma maneira tão... tão desprendimento!

- Eu sei que...

- Os teus pais merecem todo esse carinho que sentes por eles. Acho que apesar deles nunca terem encarado de frente o problema... do facto dos meus pais me baterem... eles merecem toda a consideração que tens por eles. Deram-te, e ao teu irmão, a melhor educação que duas crianças poderiam ter: além de casa e roupa lavada, deram-vos amor e carinho, compreensão. Tu tiveste tudo aquilo que eu sempre desejei e nunca tive- O meu pai nunca mostrou que me amava. A única forma era quando me batia ou me castigava e me dizia que só fazia aquilo para o meu próprio bem.

Inevitavelmente aquelas lembranças só me traziam dor e raiva. E inevitavelmente faziam-me chorar. As lágrimas desceram consoante eu falava e me recordava daquilo. Não queria chorar, especialmente num lugar público. Especialmente frente ao Ricardo. Já tinha chorado tantas vezes quando éramos mais novos. Pensei que já tinha passado aquela fase, pensei que tudo já estava colocado para trás das costas como se de uma poeira se tratasse. Mas sentia-me tão vulnerável nas últimas semanas. O divórcio, a morte do meu pai, novamente o divorcio, as discussões, as recordações constantemente a assombrarem-se a mente. Tanta coisa...

- Não te queria pôr triste, Di.

- Não tens culpa. Vou só ali à casinha. Venho já. Podes começar a servir-nos. - Afirmei, quando o empregado trouxe a travessa com os medalhões de carne de vaca e batatas fritas aos palitos que íamos partilhar.

 

 



DESAFIO

Coloquei-vos há tempos o desafio de darem um TÍTULO à nova história que se irá desenvolver nos próximos meses aqui. Ainda não vos dei muita informação, a não ser que as personagens se chamam Rafael e Juliana e que trabalham na mesma empresa. Conforme vou publicando os posts, certamente irão perceber que há muitos segredos para serem revelados...
Além do título, também espero que deixem nos comentários o vosso feedback.
Obrigado
A Gerência

Rubricas:

Além de uma nova história a decorrer no blog, acompanhem também a nova rubrica do blog 'PERDIDOS E ACHADOS DA VIDA', pequenos textos que incidem sobre... Leiam e descubram...

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