A indecisão. A incerteza.
Ter algo e não se ter a certeza de que se quer.
Até hoje, sabia que apenas uma vez na vida tivera uma certeza: fugir de casa. A partir daí seria aproveitar tudo o que vida teria para me oferecer. E achava que o tinha feito. Achava que tinha vivido até ao limite das minhas possibilidades. Achava que o Tiago tinha sido a melhor coisa que me tinha acontecido, juntamente com os nossos amigos em Lisboa.
Mas esta fusão entre o passado e presente fazia-me duvidar de todas as minhas decisões até àquele momento.
Havia a minha percepção das situações, idêntica à do Ricardo e a das outras pessoas. Não me incomodariam tanto se o meu marido não estivesse incluído nesta última.
Mas ainda assim sentia-me injustiçada. Tinha sofrido tanto e ninguém compreendia. Pior, quase ninguém era capaz de acreditar que o meu pai tinha sido capaz de me maltratar física e psicologicamente. Não. Ele não. Ele era o exemplo da vizinhança. Abastado, com uma casa de fazer inveja, sempre bem limpa, o jardim sempre bem aparado; a filha tinha possibilidade de andar na natação, de ter aulas de música; a mulher deixara de trabalhar fazia muito tempo e podia dedicar-se somente à lida doméstica. Como um homem destes podia fazer algum mal à família?
Esta última figura familiar tivera a sua quota de participação, ainda que passiva. Acreditava que o meu pai é que tinha qualificações para me educar e, como tal, do pouco conhecimento que tinha, não colocava em causa. Quando me aproximava dela para me queixar de algo que eu pensava que era injusto, as suas palavras eram somente: 'o teu pai é que sabe. Se te bateu, é porque deste motivos para tal'.
Mas as provas físicas eram mais difíceis de aceitar. A minha mãe não acreditava que o meu pai fosse tão longe na minha educação e então acusava-me de mentirosa. 'Como podes dizer isso do teu pai? Ele adora-te, só quer o melhor para ti e é assim que tu lhe pagas? És uma ingrata, Diana'. Estas palavras repetiram-se até realmente me aperceber com pouco mais de dez anos que a minha mãe não era igual às outras mães: o centro da sua vida era o marido e não a filha...