Olhei o céu estrelado e expeli o fumo do cigarro, que tinha acabado de acender.
Aquele maço já morava há praticamente uma semana na minha carteira e apesar de não sentir necessidade da nicotina diariamente, transformava aquele preciso momento numa situação de suposta serenidade.
A noite estava amena e sossegada. Quase não se via vivalma na rua. Tudo estava a dormir. As luzes iluminavam os passeios, os carros e os gatos vadios.
O relógio digital da mesa-de-cabeceira marcava quatro da manhã quando acordei e decidi ir para a varanda. Sentei-me na cadeira e gozei da minha própria infelicidade. Só me conseguia lamentar e cismar nos problemas que tinha e voltava, como já era habitual nos últimos meses, a pensar na hipótese de voltar para Lisboa, o único local onde me tinha sentido realmente feliz.
Tornei a sentir vontade de chorar e não me fiz de rogada, deixando que toda a dor que sentia e que provocava um constante desconforto no estômago extravazasse.
Apenas por volta das sete horas é que regressei ao quarto. Sentia-me cansada, como se tivesse trabalhado mais de doze horas seguidas.
Quando voltei a acordar, já era quase meio-dia. Despi o pijama suado e fui tomar um banho. A água descia pelo meu corpo, retirando todas as impurezas de uma noite mal dormida.
Saí do duche e preprarei-me para enfrentar o espelho. Olhei-me e senti as mazelas que estas duas últimas noite tinham feito no meu rosto. Estava pálido e as olheiras acentuavam-se cada vez mais.
Saí do quarto e reparei que reinava um silêncio quase absoluto. Ouvia-se apenas o leve chilrear do canário avermelhado na sala e um qause pseudo-ruído do televisor.
- Conseguiste dormir alguma coisa? - perguntou a Filipa, ao aperceber-se que me sentia perdida ali no meio do corredor. - O Mário saiu com a Mariana. Foram até ao parque e depois iam até à mãe dele. Deve chegar só lá para a uma, uma e meia. Entretanto vou-te preparar qualquer coisa para comeres.
- Queres que te ajude em alguma coisa?
- Não te preocupes, querida. Vai para a sala, que eu já vou para lá. - passou carinhosamente a mão pelo meu braço e encaminhou-se para a cozinha.
O sofá preto de quatro lugares, mais chaise-longue, estava encostado à parede do lado esquerdo e uma mesa de cor wengué situava-se mesmo em frente, em cima de um tapete vermelho. A televisão moderna estava em cima de um simples móvel, também de cor negra, a um canto. O outro móvel da sala ocupava parte da parede da direita, onde estavam livros, uma estante para carros de rally de colecção e meia dúzia de peças de decoração combinadas exactamente umas com as outras numas prateleiras.
A Filipa trouxe um tabuleiro com torradas, café e leite e ainda um copo de sumo de laranja natural, que tinha por hábito beber de manhã.
- Já percebeste que há alguma coisa errada... - lancei para o ar, virando-me para ela. A Filipa estava sentada no sofá, com as pernas cruzadas em cima.
- É evidente que estranhei a súbita visita e ainda por cima o facto de vires sozinha. Mas suponho que já te sintas preparada para falar...
- Nem por isso! - Sentei-me ao lado dela e peguei na caneca do leite, misturando um pouco de café. - Eu e o Tiago vamo-nos divorciar.
- Foste directa, Di! - disse, limpando uns requícios da bebida que tinham escorrido pelo queixo, depois de se ter entaldado, perante tal afirmação. Recompôs-se e retorquiu - Já tinha reparado que vocês não andavam bem, mas não pensei que já tivesse chegado a esse ponto.
- Há mais de dois meses que não estamos juntos, mas com a morte do meu pai aproximamo-nos. Mas com isso, voltei a casa, revi o Ricardo e o Tiago começou só a fazer disparates.
- Tanta revelação de uma só vez! Realmente, Diana, só memso tu. Custa-te a começar, mas quando o fazes, as revelações não páram. - ironizou a Filipa, bebendo mais um pouco do sumo. - Conta-me lá isso direitinho.
Resumi o menos que pude, pois a Filipa gostava de todos os pormenores numa boa história de vida.
- Agora vais-me explicar uma coisa, Diana. De qual gostas mais? - perguntou num tom jocoso.
- Isto não é um assunto para brincadeiras, Filipa. Apesar das discussões com o Tiago, nunca tivemos a certeza que a solução seria o divórcio. Mas depois apareceu o Ricardo... É que nunca esteve em causa o amor que eu e o Tiago sentíamos um pelo outro, mas agora...
- Pois, agora... Estás dividida entre dois homens! - exclamou.
- Filipa, não se apaga com facilidade um amor, uma relação de mais de cinco anos e muito menos um amor de infância, como se costuma dizer, qeu eu e o Ricardo tivemos.
- Sim, está certo. Então, diz-me o que te agrada mais nestes dois homens? É que eu não conheço o Ricardo, mas o Tiago sim, e sempre te disse que vocês eram o oposto...
no entanto devo dizer que esta história está a ficar muito interessante, e consegues mesmo prender o leitor, da primeira à última frase.
Demora muito o próximo capítulo?
Beijinho